COMO SE EU FOSSE (QUE DEUS ME LIVRE E GUARDE) DIADORIM, E A CANETA O SEMPRE DURO, IRRESISTÍVEL E ERUPTIVO PAU DO JAGUNÇO RIOBALDO

...escrevi, faz tempo, um poema intitulado
“POETA QUE SENTA-SE PARA ESCREVER”...

E como eu, leitor, vivo continuamente
desconfiado da quantidade e qualidade
de sua inteligência que, imagino, seja pouca,
curta, grossa de casca, implantada e/ou artificial,
resolvi , por isto, ejacular estes versos explicativos
dizendo que o que eu quis dizer ao confessar
que sento-me para escrever, foi que, mesmo
desprovido de um tema e privado temporariamente
daquela emoção parturiente e propulsora
que, uma vez desencadeada, faz com que o transmorfo
e bovino tempo, por exemplo, se transforme
metaforicamente numa vaca
para que eu, emocionado, vulgo inspirado,
o ordenhe esferograficamente... Pois bem,
mesmo e ainda assim, eu sento-me, me sentindo
provisoriamente abandonado pela inspiração e, transpirado,
apenas friamente transpirado,
escrevo... escrevo... escrevo... como se eu fosse, ai de mim,
(que Deus me livre e guarde), Diadorim, e a caneta
o sempre duro, irresistível e eruptivo pau do jagunço Riobaldo...


José Lindomar Cabral

POETA QUE SENTA-SE PARA ESCREVER

... sou um poeta armado,
desses a respeito dos quais
as emoções fáceis se entreolham
e dizem, desanimadas, umas para as outras:
Sem chance... Esse aí nunca jamais
estará à nossa mercê,
como Drummond, por exemplo
paradoxalmente algumas vezes esteve...

Quer dizer, sou um bardo
apoderado debitamente
da herança cultural
e que, além de exercer remotamente
controle inclusive emocional
sobre a intuição,
senta-se para escrever
e escreve... escreve... escreve...
escreve mesmo quando
o tempo, aos coices,
recusa-se bovinamente a dá leite
e o vento, coiceiro, anuncia, mugindo:
Hoje ninguém me ordenha,
nem ainda que o brejo vá à vaca
e esta, resfriada, seja contraída
pelo bacilo que deu notoriedade a Cock,
leia-se,
pela turberculose, e tussa... tussa... tussa...

José Lindomar Cabral

COMO ME VINGO DA ONIPRESENÇA DO LEITOR

... vingo-me da onipresença do leitor
(sim, leitor, seu paulo coelho de uma figa,
leia-se, seu pulha, seu geralmente pulha,
você, sua sombra hipnotizada,
está irremediavelmente presente
em tudo que escorre esferograficamente
dos meus dedos, destes dedos ressentidos
porque foram desprezados pelos ânus apertados,
mas profundos, dos orgulhosos pianos de cauda
apenas porque os mesmos não são suficientemente
longilíneos, pelo menos não o bastante
para os satisfazerem analmente
em termos de comprimento)...

Porém, como estava dizendo: Vingo-me, leitor
da sua onipresença, fazendo de conta que sua cabeça
é uma vagina rasa e bastante estreita, e os meus escritos
são rústicos cacetes propriamente ditos, e cacetes longos,
grossos, duros e com farpas, farpas à guisa flageladora
de asas, por meio dos quais, impiedoso e despertador, o estupro
sem preliminares, sem cuspe e sem o lubrificado
escorrego das meninas, ou seja, a seco ou sem vaselina...


José Lindomar Cabral

ATESTADO DE INCLUSÃO

... incluído dos incluídos
não consinto que me excluam...

Porém, ainda que fosse excluído
dos excluídos, atrevido, abelhudo
e desmedido como só eu mesmo
consigo e me permito sê-lo,
mirar-me-ia no exemplo grego
(leia-se, trágico)
de São Francisco dos Santos
vulgo Madame Satã
que sendo negro, pobre, homossexual
e homicida e, portanto, menos excluível
e excluído impossível,
hoje faz iconicamente parte
do imaginário cultural
da porra dessa desnação
ou país interrompido e vil
que devia chamar-se Pau Vermelho
ou Madeira Escarlate, e não Brasil...


José Lindomar Cabral

O SEGREDO DOS SERES MÁGICOS

... os seres mágicos existem...
Refiro-me à fadas, duendes
(verdes ou não), centauros,
faunos, gnomos,
etc., etc., etcétera...

(Meu Deus, os céticos agora
vão me tirar o couro,
dizendo, coitados,
que os únicos parafusos apertados,
prestáveis, que me ainda me restavam
acabaram de perder as roscas
e a partir de então
já não são mais capazes
de se manterem apertados
às suas respectivas porcas;
isso metaforicamente falando, é claro...)

Pois é, leitor incauto, o reino do inferno
é astuto e tão organizado,
a ponto de se dividir em castas:
cada uma delas com a responsabilidade
específica de imbecilizar e enganar os humanos,
pois segundo o ponto de vista de Boi Zebu
digo, Belzebu, o maior de seus príncipes
e o mais respeitado dos seus estrategistas,
os humanos
são um povo débil e menos prudente
do que os coelhos que fazem sua casa
na rocha e não em nuvens de areia
como os imbecilizados homens...

O que é, por exemplo, uma fada-madrinha
(aparentemente tão boazinha)
aos avisados olhos abertos
de um vidente do Deus Vivo, senão
um demônio feminino encarregado
de praticar o bem com a subjetiva finalidade
de "comer metaforicamente mais tarde o cu do coveiro"
leia-se, de lá na frente, quando o corpo
afilhado tombar à sepultura,
assenhorear-se da alma dele e arrastá-la
para o Hades, de onde a infeliz só sairá,
depois da consumação dos séculos,
para ser lançada (após a classificarem
como bode de pêlo liso, diz-se, bicho de Labão),
juntamente com a caprino Belzebu
e seus letrados exames de moscas simbólicas,
no Lago de Fogo Líquido e Enxofre Ardente
e ali haverão de chorar e ranger os dentes
para todo e inconsumável sempre...

José Lindomar Cabral

O CACHORRO DO LULA É LADRÃO E HOMOSSEXUAL ATIVO

... Brasil, não te amo, nunca te amei
nem jamais te amarei ...
Porém, não te deixo...

Imagina se eu ia dar, por exemplo,
ao cachorro ladrão do Lula Lá
o gostinho de me ver, como se diz à chinesa,
pela flor-do-parque-de-trás,
entenda-se, de me ver pelas costas...

Não, leitor, eu não quis dizer que o cão
que Lula cria rouba, não...
Eu disse que ele, o (im)próprio Lula Ali Babá é ladrão...

Ladrão só, não: ladrão e homossexual ativo
haja vista que o Erário é masculino
e ele - o atual Presidente da prostituta
e mortuária República
desta florestalmente, inclusive florestalmente
devastada nação interrompida chamada Brasil -
está quase deixando o mesmo (o Erário) sem ânus
leia-se, desprovido de fundos, de tanto estuprá-lo...

José Lindomar Cabral

LITERATURA DE ALTO NÍVEL

... escrever, pra mim, além de ser
uma necessidade fisiológica,
é também uma terapia
cuja ocupação consiste
inclusive e principalmente
em ordenhar o tempo,
modelar o vento
e transformar esferograficamente o ócio
em divertidos, vernaculares
e acinzentados bonecos de tédio,
de tédio à guisa de neve...

Terapia, portanto, ocupacional
ou entretenimento terápico este
que me faz colateralmente
muito mau e mal
porquanto não é possível
fazer literatura de alto nível
com sentimentos de mocinho
de filme, por exemplo; exceto
se o mesmo for
um filme, não de amor,
mas noir ou de terror...


José Lindomar Cabral

SEM PAPAS (NEM FREIRAS) NA LÍNGUA

... não tenho papas
(nem freiras) na língua...
Tenho farpas
e um palato quase de pedra
que se ressente
de não ter estrelas
apesar de ser chamado
eufemisticamente céu...


Josè Lindomar Cabral

ODE AO PRAZER QUE ESCREVER ME DÁ

... porra, Clarice, porrra!!!...
Eu que devia ter lispectormente escrito
" Eu sei muito pouco,
mas tenho a meu favor tudo que não sei"
(e acrescentado:)
e por isso escrevo... escrevo... escrevo...
... porque, pra mim, o ato de escrever,
apesar de doer,
me dá mais prazer
e é mais difícil de me abster
do que fazer eufemisticamente amor,
do que comer, do que viver
(e ‘fazer eufemisticamenter amor’
porque amor não se faz,
muito pelo contrário, é o amor
que nos faz
inclusive melhores
e um pouco mais racionais que os animais)...

José Lindomar Cabral

O HOLOGRÁFICO ADVENTO DA “COVA DA IRIA”

... desde antes do fabricado ( leia-se, do holográfico) advento
da “Cova da Iria”,
quer dizer, desde antes que a terra fosse informe e vazia
que eles já eram expert em holografia
(e por eles, aqui, entenda-se, aqueles que se dizem exta-terrestres
quando na verdade são demônios cientistas ou anjos caídos
que ao serem expulsos para sempre do Oriente do Alto
trouxeram consigo o que existe de mais ponta
em se tratando de ciência e tecnologia)...

Por isso, leitor, recite comigo:
“A 13 de maio na Cova da Iria
no céu aparece” o holograma
da sexualmente promíscua
e venérea deusa Cibele
se fazendo passar por Maria
a que teve o hímen rasgado
pela cabeça do menino Jesus
na hora do seu obviamente
dolorosíssimo parto
(e é isto o que eu chamo
de ir direto ao coração das trevas
e cravar nele, sem cuspe, sem vaselima
e sem anestesia o que existe
de mais pontiagudo, destemido
e farpado em matéria de escrita)...

José Lindomar Cabral

EU E A POLÊMICA

... eu e a polêmica sentimos
uma atração, inclusive sexual,
um pelo outro...

Algo assim como se ela
(que na verdade é um Sucubus
vulgo demônio feminino
encarregado de seduzir os homens
que não se deixam perder pelas ilhas)
fosse... vejamos... ah, já sei: uma égua
continuamente no cio, e eu o cavalo alado
(uma espécie irresistível de Pégaso jovem)
mais bonito, cobiçado e pauzudo do mundo...

José Lindomar Cabral

O AMOR É MAIS DIADORIM DO QUE RIOBALDO

... puta que pariu...!
Não, não sumiu...
Realmente, leitor,
Não dá pra rimar
Amor com Doril
(Nem com Almodóvar)...

Concordo: das poucas
Sequelas que o amor
É incapaz de curar
Uma delas
É a dor de Lindomar,
Leia-se, a dor de amar
Imitando os anjos,
Ou seja, de maneira desatada
Quer dizer, sem dar a mínima
Para o fato crucial, purificador
E anti-cinematográfico
de ser ou não correspondido...

Isto sem falarmos aqui
(E falando assim mesmo)
Que o amor é mais Diadorim
Do que Riobaldo,
Entenda-se, mais doloroso
Do que perigoso...

José Lindomar Cabral

O ALUNO DO SILÊNCIO E DA SOLIDÃO

... lendo Cecília Meirelles aprendi
inclusive e principalmente
que não quero condescender,
quer dizer, escrever como ela escrevia,
apesar de desde a minha infância
até hoje eu continuar sendo
um dos melhores alunos
que a solidão e o silêncio já tiveram
(e continuam tendo)
o privilégio de ter...

José Lindomar Cabral

O SONHO DE Henry Kissinger

... o sonho do hematófago, ocultista
(leia-se satanista) e reptiliano
Henry Kissinger
(sonho este que, infelizmente,
está sendo literalmente transformado
em realidade) é dizimar
30% da humanidade
por intermédio
de pandemias personalizadas
ou seja
criadas genética, sacrificial
e especificamente
para essa negra e hedionda
finalidade, e de armas secretas
tão poderosas que já são capazes
de provocar, por exemplo,
secas seculares, invernos
com “ene’ anos de duração,
chuvas 100% ácidas, trombas
d’água por encomenda, terremotos,
etc., etc., etc. e maremotos seguidos
de tsunamis de até 200 metros de altura
que se deslocam fulminantemente
sabe Deus (e Mooloch, o deus deles, também sabe)
a exatamente quantos quilômetros por hora...

José Lindomar Cabral

O INFERNO DE MINHA POESIA

...sou o inferno de minha poesia
que gostaria de ser seca
e impessoal como a da "Salomé
das vossas letras"
o tal de Melo Neto: João Cabral...

Falo sério, leitor, os meus versos,
se pudessem, se tivessem
a independência verbal
que tanto almejam,
além da vontade própria
que eles, os tais versos, de fato,
têm mesmo,
expulsariam do seu corpo vernacular
todos os dados que me dizem
autobiograficamente respeito...

Desde o abutre simbólico
que devora-me literalmente
o fígado metafórico,
até a cinza quase literal
dos neurônios perdidos
que, uma vez queimados,
infelizmente não se recompõem jamais...

Isto sem mencionarmos aqui
o desejo frustrado de expelirem
dos seus próprios corpos verbais
as viscerais apropriações
familiares de que me utilizo
para compor as imagens poéticas
que denomino, arbitrário e confessional
de papai... mamãe...
personagens estes que infelizmente
não são, ai de mim, assim tão alegóricos
quantos eles (o papai... a mamãe...)
neste ácido, corrosivo e convulsivo contexto
gostariam de ser...


José Lindomar Cabral

LÍNGUA DE PAU E PALATO DE PEDRA

... quando escrevo
(e só raramente Eu Prometeu acorrentado
a este Cáucaso chamado escrivaninha
não estou a escrever, digo, a ver meu fígado
sendo dilacerado pelo abutre transmetamorfo
denominado caneta, me rapinando
vulgo escrevendo, escrevendo, escrevendo)...

Porém, como estava dizendo:
quando escrevo,
costumo fazer tão convincentemente
de conta que tenho língua de pau
e palato de pedra
que as estrelas que outrora haviam
eufemisticamente no céu de minha boca
foram reduzidas, faz tempo
a pó estelar quase que propriamente dito
pelo impacto seco e replicante
da língua dura e ritmada
a bater secamente de encontro
ao referido, concreto, desestrelado
e eufêmico firmamento...

José Lindomar Cabral

O ALUNO DO SILÊNCIO E DA SOLIDÃO 2

... com o silêncio aprendi, por exemplo
muitas línguas (dentre estas, o puído
e encardido dialeto dos trapos)
e acabei me tornando tradutor
até mesmo da linguagem lamentosa
(e cerebralmente, só cerebralmente audível)
das coisas...

Já a solidão me ensinou, inclusive
que nada (pelo menos no meu caso)
é menos falso do que eu dizer
que não me sinto sozinho
em nenhum dos meus caminhos,
haja vista que eu, de fato,
além de ter Deus
vivo cheio e rodeado de eus:
eus rasos, eus profundos,
eus meus, eus de todo mundo,
eus próximos, eus alhures
eus escravos, eus alforriados
e sabe Deus quantos outros zeus,
outros ‘zeus’, não - outros eus...


José Lindomar Cabral

RAZÃO DE EU CAIR TANTO EM CONTRADIÇÃO

... eu, por ser mais verdadeiro do que beça
(se fosse falso e costumeiro teria escrito ‘à beça’)
acabo sempre caindo muito, muito mesmo
em contradição (já os mentirosos são derrubados
freqüentemente pela coerência, e ‘freqüentemente’
tremado, ou seja, ortograficamente não reformado)...

É verdade, leitor: de vez em quando me contradigo
já que hora me declaro aluno da solidão
e hora solto paradoxalmente a confissão
de que sou tão vário, leia-se, demograficamente
tão denso, que só de eus rasos
(isto sem falarmos nos profundos)
sinto-me, no mínimo, uma legião...


José Lindomar Cabral

VOZ DO QUE CLAMA NO DESERTO DAS LETRAS

... mais uma vez testifico de mim mesmo:
Sou A Voz Do Que Clama
No Deserto Das Letras aos outros poetas
(João Batista, por exemplo
clamava no deserto propriamente dito), dizendo:
Eia, caprinos de pêlo liso ou bichos de Labão,
endireitai o grande sertão metafísico
e/ou as veredas colaboracionistas dos vossos
textos desprovidos abominavelmente
de hímens simbólicos, ou seja, dos vossos escritos
desvirginados sacrificialmente
pelo ex-Estado que já passou, faz tempo
a ser chamado de Mercado Financeiro Global
e os vossos versos condescendentes, hegemônicos
estão a serviço do dito cujo e do caprino deus dele
que é o deus (obviamente falso) e maior
da Era de Aquário
Ou Nova Ordem Mundial,
refiro-me ao Bode Unicórnio:
o pseudo Construtor do Universo
ou melhor, ao transmetamorfo “Senhor das Moscas”
que traduzido significa Boi Zebu,
quer dizer, Belzebu, e as moscas obviamente
alegóricas são tanto a terça parte
leia-se, os 30% dos anjos renegados
que foram expulsos para sempre do Oriente do Alto
e os acultistas adoradores deles
como também todos aqueles que estão
às vésperas de receberem na testa
ou na mão direita o número prévia
e milenarmente anunciado da Besta
que desmetaforizado não é outro senão
o amaldiçoado biochip que está sendo
maçonicamente fabricado, aos bilhões,
pela Motorola, sim, leitor, pela fedorenta
e nipônica Motorola, e fedorenta porque podre de rica
mas ela fede também inclusive a enxofre
embora a enxofre nem sempre, não necessariamente
haja vista que satanistas (sincrétistas ou não)
também são chegados a "rolas de ricos"
entenda-se, a perfumes caríssimos...


José Lindomar Cabral

SENSAÇÃO DE HAVER PERDIDO MUITAS PREGAS OU CAGADO UMA MELANCIA

... sim, é isso mesmo: vão à merda, suas imprestáveis!...

Estou xingando, leitor, a inspiração e as musas
pois não preciso literariamente da ajuda
de nenhuma delas...

As musas então, nem se fala!...

São mais inúteis que a Morte,
uma vez que não me inspiram nada,
nem mesmo vontade de detratá-las...

Já a cu doce da inspiração, apesar de detestar
os poetas que, como eu, andam sempre armados,
transpirados
e a serviço das emoções difíceis (como diria
Drummond, embora não literalmente assim)
às vezes a infeliz desadoça o seu infernal
e franzido orifício anal
e inventa, sem ser chamada, de me servir
de parteira, o que, convenhamos,
a torna - e haja ironia! - de certa forma
desnecessariamente menos inútil,
e ‘desnecessariamente’ porque na hora
do poeta dá cria o único a correr risco
de vida é a criança, leia-se, a poesia,
apesar de alguns poemas me deixarem
com a traumática, deprimida e despregueada
sensação pós-parto
de haver expelido uma melancia
sabe Deus (e o Diabo também sabe) por onde...


José Lindomar Cabral

PARA NÃO RIMAR AMAR COM ALMÓDOVAR

... só depois de haver adquirido maturidade
(aquisição esta alcançada antes de conquistar algumas rugas,

sim rugas são conquistas)
foi que pude então compreender
que amar não é coisa de meninos, quer dizer,
não é brinquedo, haja vista que o amor queima mesmo
qualquer um que, amando, não esteja preparado
para lidar com o fato consumidor de que o amor, ao contrário
da paixão que não for segundo G.H., é fogo eterno,
perpétuo e não uma efêmera chamazinha
que permanece infinita somente enquanto
dura a efemeríssima palha fumacenta que a alimenta,
uma vez que confessar, por exemplo,
“deixei de amar fulano(a)”
não passa de uma eufêmica e anestesiadora expressão
por meio da qual o sujeito procura proteger-se
da dor que emana da compreensão apenas inconsciente
de que o amor que o inspirara a amar alguém
em vez de haver se extinguido, na verdade, acabou
achando-o aquém, leia-se, verde demais para a missão
de alar e desatar o outro, e por isso imigrou de corpo
a procura de um coração desatado e/ou preparado
inclusive para usar suas próprias cordas
de maneira que as mesmas pruduzam harpejos,
não amarração, entenda-se, um coração apto
para não rimar amar com Almódovar,

ou seja, para não rimar amar com atar...

José Lindomar Cabral

O OLEIRO DO PENSAMENTO

O poeta é o oleiro do pensamento:

em vez de argila, vento...
Este poema, por exemplo,
é a materialização artesanal de algo
abstrato que até pouco tempo atrás
a gente chamava: Ô brisa,
venha cá." E ela - a brisa –
obediente e suave como ela só,
vinha que era uma beleza...

José Lindomar Cabral

LEITE DE TEMPO E DE VENTO

... às vezes quando não estou dormindo nem acordado

(pois é assim que escrevo: arrebatado pelos sentidos)
eu ouço o vento mugindo e vejo o tempo pastando, ruminando
as horas... os textos... os fatos... os acontecimentos...
como o boi pasta e remói a erva do campo; e então
ponho-me a ordenhar o tempo e a puxar verbalmente
as curtas e arrochadas tetas do vento
das quais extraio, quente e espumante, o leite
mais racional que existe, que é a essência dos temas
que antes de serem transformados em poemas
primeiro os faço descer ao centro magmático, convulsivo
e eruptivo do meu ser
que é o lugar onde fica situado o Templo do Assopro
que herdamos de Adão, vulgo Espírito
(os budistas chamam-no Nirvana)
para que ali os mesmos sejam passados purgativamente
pela chama branca do altar que lá existe
para só então, purgados, voltarem à tona, virarem versos
e serem, enfim, apresentados ao público,

a um público que, infelizmente,
está sendo tornado cardiomentalmente

cada vez menos distinto,

como se a humanidade inteira,

salvo raríssimas exceções,

tivesse sido completamente

abduzida biochipada...

José Lindomar Cabral

Meta Poética

Nada do que lhe digo é bobagem
Mesmo que na mínima existência da minha essência
Seja apenas uma computação de alienígenas manetas
E corais de caramelos chorando pelos campos

Nada, absolutamente nada é como penso
Nem os teus, muito menos meus sonhos
Serão exacerbados nas profundezas de uma dose de tequila
Nem em Manaus muito pouco arriba de nosotros.

Se tu faz de mim somente um pedaço de poesia
Deve ser porque não temos tempo para as canções
Faz de mim o que quer, floresce de loucura minha mente
E não deixa um segundo de lucidez sequer.

Etâ poesia arretada, luz castigada de ingratidão
Estirpe poética de poetas mal amados
Aliena minha frustração pelo prazer de não ser
Aquilo que tanto meu pai queria que fosse

Um trovador ou um bem sucedido vendedor de camisetas
Que batesse de porta em porta oferecendo
Poemas confeccionados em retalhos de algodão
Algo tão obvio quanto necessariamente seria

E toda essa coisa de ser eu esse poeta confuso
De não conseguir encaixar as palavras em suas entranhas
Desafiando cada vez mais cansativo as leis da física
Desentoando e vomitando rimas

Em cima das tuas palavras
Poesia, poesia e cachaça
Somente isso, não trepo mais com você
Poesia, patética meretriz da minha vida.

A pipa

A pipa apita para onde?
No nariz vermelho de geléia
Na boca ensaboada de caramelo
Apita a pipa para o céu

Apita o vídeo-game
Hora de jogar
Do banho
Do sono

Apita pipa e caramelo
Vermelho na boca de geléia
Nariz para o céu
Ensaboada a pipa pára e apita.


Hora de acordar
O relógio apita minhas aulas
Sem desenho animado
Isso somente sábado
A pipa apita
Apita a pipa pita pipa!

Conjuntivite nº 1

Eu não escondo nada...
Embora permaneça abraçado ao teu destino
Pouco a pouco deito os ombros
abaixo os olhos
balbucio duas ou três palavras de amor ao teu ouvido
e jogo longe toda a decisão
toda a calma e a segurança
e o desespero planejado
e te puxo com força pra perto.
Teu sussurro silencioso
a melodia descompassada de mil sinos
e eu me vejo soprando a razão
pra fora da sala
entregue
mudo
quase me arrastando...
e teus dedos passeiam por toda a enorme alma
acaricia
desliza
adormece
anestesia
sou teu
e não escondo nada...

Contículos

Ela previu que naquele exato segundo haveria uma suave intenção que destilaria, por cada centímetro do quarto, um sentimento frio de desilusão.

Respirou fundo e caminhou distraidamente em direção à ele, baixou os olhos e assoviou calmamente uma canção dos Stones...retirou do bolso um punhado de sentimentos ,
disparou acidentalmente meia dúzia deles no rosto estúpido daquele estranho...moveu os lábios entoando um mantra ...o beijou no rosto...calmamente enterrou o punhal em seu estômago...
girou lá dentro em um ritmo acelerado, quando ele desmaiou frio no carpete encardido da sala ela beijou sua testa...levantou calmamente e continuou a assoviar Stones...caminhou em passos flutuantes para fora da sala...abriu suas asas e sumiu na noite escura...ainda se ouvia o assovio...e seu rosto cintilando na retina...